sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

Parece que eu fui à Feira?


À MARGEM DA FEIRA DO LIVRO 

    Não é a primeira vez que acontece. A propósito, isto ocorre com bastante freqüência: saio para ver ou fotografar determinado lugar ou tema e quando caio na realidade já fiz um monte de fotos que nada têm a ver com a proposta original. Faltou convicção? Não é bem assim. Fotografar a Feira requer uma concentração especial. Não é só retratar as barracas, os estandes com livros, os autores dando autógrafos. É preciso, antes de mais nada, desligar. Desconectar de tudo o que existe na periferia, fora da efervescência colorida e fascinante que é este pequeno grande mundo de livros e pessoas de todos os tamanhos, idades e biótipos. E ficar atento. E flagrar a infinidade de cenas e ângulos inusitados que repentinamente se sucedem. E tentar introduzir numa imagem plana, dentro do pequenino retângulo do visor da minha câmera, as histórias e epopeias que só uma enciclopédia consegue comportar. É indispensável “entrar” na Feira. Sincronizar com seu espírito e com as faces múltiplas com as quais ela se metamorfoseia a cada instante. 





 

    É o que tentei fazer. Mas a minha Cidade é atraente demais, mesmo para aqueles que, como eu, estão habituados a observá-la em seus detalhes, em suas minúcias que passam despercebidas pela maioria dos mortais que circulam por ela na azáfama do dia-a-dia. Quanto eu a tenho fotografado! Cada prédio antigo ou contemporâneo, cada templo, teatro, parque, banco de jardim, muro, avenida ou simples ruela. Cada ângulo do meu Rio, cada chaminé, escadaria, monumento, galeria, calçada e esquina. Cada jacarandá, paineira, flamboyant e tipuana. 

    Assim, sempre que volto a passar por eles percebo nova perspectiva, nova cor, novo pormenor só agora captado. Dezenas, centenas de vezes que tais lugares voltam a ser fotografados, mostram imagens diferentes, nunca repetidas e impossíveis de serem reconstituídas. São únicas. Sempre inéditas. 

    Ah, minha Porto Alegre! Cada vez admiro mais o Mario Quintana, que sem uma câmera fotográfica, sem uma tela e pincéis, teve a sensibilidade que só aos anjos-meninos-poetas é facultado ter, de te retratar na tua intimidade e beleza ímpar apenas com versos. Apenas! 









    Por isto fui à Feira e não a fotografei. Perdi-me no caminho. Só bem mais tarde lembrei-me dela. Mas amanhã eu volto, com certeza. Então, vou embrenhar-me por seus labirintos – os mesmos percorridos por Quintana e pelos quais o La Porta badalou sua sineta – e retratar, tanto quanto eu seja capaz, as imagens etéreas que dela emanam em sua atmosfera onírica. Assim o prometo! 

Evandro 

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